quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

A ponte quebrada ainda é ponte

  Incrível ou entristecedor é o modo como são dadas as relações de convívio em nossa sociedade, se por um lado a rotina faz com que tenhamos segurança, por outro nos acomoda. E vamos vivendo em um buscar constante de algo que nem ao menos sabemos do que se trata, por vezes criamos a ilusão de que a estrada está pronta e só nos resta segui-la, desviando dos obstáculos que todos já conhecem. Treinamos, pois, o mesmo jeito que todos os outros tiveram para tentar solucionar algo tido como empecilho no decorrer de sua jornada. 
  O gosto por vezes amargo demais de uma possível derrota começa a ser sentido antes mesmo daquela se tornar concreta. E por não raras vezes deixamos de chegar às rosas por medo dos espinhos. Esquecemos pois que o líquido retido também pode nos fazer, tanto mal ou até mais do que a sensação de dor caso inevitável fosse o rasgar do possível pontiagudo. Evitamos uma dor, ou apenas a alimentamos? 
  Enquanto o turbilhão nos assola, e nos pega em momentos de reflexão, do lado de fora há um jardim cheio de perfume, de rosas e de espinhos. Enquanto o portão se mantém trancado, a chave está guardada em nosso bolso. Hesitamos pois em usa-la, por medo de perde-la ou de quebra-la. 
  Mas por que temos tanto medo de perder ou quebrar uma chave que tanta dor nos traz ao nos deixar presos em um ambiente interior que não nos conforta? Será mesmo que exista tal chave, ou será que o que prende a porta não é nada mais que um velho cordão já sem fibras suficientes para amarrar o que quer que seja? 
  As limitações pelas quais passamos são revestidas de um pudor desnecessário, e o desnecessário passa a ser poeira, que se acumula e aos alérgicos é como veneno. Não traz consigo a elegância e o perigo da mais bela espada, mas esconde as doses que matam aos poucos. E o que nos serve de proteção nos priva. E se nos priva é por que não nos protege, mas nos bloqueia. 
  Longe de mim ou de qualquer forma do meu pensar, lançar de antemão um caminho perfeito, pois assim estaria não mais do que perpetuando o que tenho como crítica. Não há solução findada para nada que nos prende de nós mesmos; A tomada de consciência é mais do que fundamental. 
 As vezes em cada percurso haverão pontes diferentes, e algumas dessas pontes podem estar quebradas, ou mesmo em dias de chuva, a enchente estar tão forte que a ponte nem ao menos possa ser vista. Mas isso não significa que ela não exista. Por vezes o que é necessário é escoar a água, ou consertar a ponte. O estagnar-se de frente ao monumento é aceitável pelo período de tempo suficiente para que as águas abaixem. Porém chega uma hora que ou se concerta a ponte, ou se atravessa ainda que um pouco molhada, pois se esperarmos demais pode ser que hajam novas tempestades, e depois de cada tempestade o ponte volte a ser coberta pelas águas, ou mesmo volte a perder partes fundamentais para que seja possível a travessia. 
  O que nos faz ter coragem para atravessa-la ou mesmo para ter atitude de conserta-la é, não a certeza, mas a possibilidade de do outro lado da margem estar um local um pouco melhor. Talvez por não conhecermos tal lado criemos expectativas para serem frustradas ou novos medos que nos façam ficar por demasiado tempo do lado que nos traz uma falsa segurança. 
  Pode ser também que com o tempo, novas tempestades ultrapassem a capacidade de suporte da obra, e a carregue consigo, evitando logo a possibilidade de de conhecermos o outro lado daquilo que pode ser o inferno ou o paraíso. Tenho por mim que a frustração de não conhecer, querendo conhecer, seja maior do que a possível frustração de um arrependimento. 
  Pode ser também que ao lado da ponte haja outros caminhos, que possam ser seguidos, mas que muito provavelmente levem a mesma ponte, uma vez que em áreas onde há um rio de proporções arrebatadoras dificilmente haverá apenas uma ponte. Logo pode ser que tomando novos caminhos, ainda desconhecidos tenhamos a falsa impressão de que estamos caminhando para a paz, enquanto estamos apenas postergando o enfrentar da ponte, ou o desabar da ponte. 
  Não há nada mais perturbador que escutar o barulho das águas, enquanto sabemos que precisamos atravessa-la. E ainda é pior quando temos a sensação que a ponte pode desabar a qualquer momento, tanto que alguns aventureiros se arriscam e correm por cima da ponte por não mais suportarem esperar, e maravilhosamente alguns conseguem chegar do outro lado. Os que não conseguem talvez aprendam a nadar e cheguem do outro lado assim como àqueles que com medo, mas com coragem e altivez passaram pelo conturbado caminho. 
  É preciso que deixemos pra traz o peso que nos coloca em risco ao estar em cima de uma ponte frágil. É preciso que avaliemos se nos é necessário passar pela ponte, por que não suportamos o velho lado, ou se temos coragem e vontade de conhecer o novo. É preciso que consertemos as nossas pontes interiores, e é preciso que comecemos a viver não pelo caminho da certeza mas pela esperança do que nos pode trazer mais paz. 
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terça-feira, 26 de dezembro de 2017

Onde está o meu Natal?

Os olhares continuavam os mesmos
E os sinos não mais badalavam
O velhinho parece não usar mais o gorro
Pois a descrença lhe nega a existência

E se desejamos um Natal Feliz
não mais sabemos o que dizemos
E a magia que era tanta
Hoje não passa de fase pronta

Feliz Natal! Diz o carteiro
Feliz Natal! Diz o cara do Jornal
E o colega do trabalho
E o irmão, e o desconhecido também

As luzes agora pouco nos emocionam
E as cantigas o que são?
A pressa parece ser a companhia
Passa-se a data, ficam-se os quilos

O que antes pode ter sido reflexão
Hoje se torna festa, ou nem isso
Difícil se torna sentido imaterial
Nem presente recupera o brilhar de um olhar infante

Será que é por que crescemos?
Será que a magia se perdeu?
Será que algum dia ela já existiu?
Talvez tenha sido invenção

Os trenós não mais se estacionam na imaginação
E os especiais de Natal já não dão caráter de iniciar
Nem mesmo a árvore ou o presépio
E o espírito se perde,  e o que fica é saudade

Saudade do Natal com chuva
Saudade do calor da data
Saudade do velho pé de Jambo
E da velha parreira com seus dois cachos

E da véspera então? O que dizer?
-Mãe! Que dia que vamos fazer o presépio?
- Mãe! Vai assistir a missa do galo?
Oh, isso sim era Natal!

Se nascia a esperança de um novo tempo
Se olhar pra manjedoura era de simplicidade
Havia pois o mais belo dos Natais
E era real... E era doce...

E ao ir nas casas de nossas avós, corríamos para a sala
E pedíamos para ligar os seus "pisca-pisca"
E olhar já dizia: - Não meche, pois isso quebra fácil!
E o olhar era inocente.

As histórias eram tão convincentes
E o dia era tão esperado
Podia ser o mais simples
Que era o mais ornado.

Ornado de sentimento,
Ornado de ilusão....
Parece que ser criança é o mais genuíno
É também o mais verdadeiro estado

Parece que ser adulto é o mais seco
É também o mais descrente
Onde procuramos tanto sentido
Onde encontramos tão pouco...

Onde queremos o que muitos querem
Onde esquecemos de aproveitar o mágico
Onde deixamos de acreditar no mágico
E que tudo se torna pouco... e o pouco se torna nada...

Onde o Feliz Natal é mecânico
Onde o estar feliz parece inatingível
Como se fosse errado imaginar
Como se fosse inaceitável fantasiar...

Dentro dos mais variados estigmas
Dentro dos mais Belos Natais
Nenhum se assemelha à magia do olhar de uma criança que acredita
De uma criança que espera ansiosa pelo tal dia

Talvez o mais triste é sabermos que isso provavelmente se perderá
E que daqui a algum tempo, também os novos adultos estarão a questionar:
Mas o que é o Natal?
Onde está o meu Natal?
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Os passos

É claro que se pode recomeçar depois de cada negativa
E é certo que pode-se pensar, avaliar
Se a felicidade brota, ela reluz e se faz presente
Enquanto lágrimas secam, lágrimas se criam

É claro que se pode olhar para frente
E por isso tem sentido, faz sentido
Se faz vivos os sentimentos
Se fazem reais as ações, emoções.

O que um dia pode ter sido ilusão
aos poucos vai tomando forma
O olhar de canseira se fecha
E reflete, e vive (se vive ou se morre)

Ouve-se o grito e o berro
Escuta-se de tudo muito pouco
Filtra o que traz o bem
Palavras que sobram, palavras que faltam

Muitos que muito falam
Muitos que nada dizem
Deixam pois o determinismo constante
Da inação se perde o caminho

E o que foi pensado para se tornar real
Se perde, se esfarela, se definha
É ouro que se vai, e ouro que se fica
Emite-se menos luz... se cai...

E a luz de ser presente
De estar presente se dissipa
E o que se quer são asas
E o que se pode são asas

Se bem sentes, se esquiva
E se priva, e se maltrata
E o pouco que era muito
Cada vez mais se míngua

A decisão que incomoda o ser
O pacato que finda o ter
O calor que pleno se torna frio
E o frio por hora compões os jeitos

E ao se servir do vinho
Talvez se quebre a taça
Por que do tudo percebe-se o pouco
E se priva do provar da mais doce das uvas

E o que era para ser eterno
Traz consigo o áspero sinal
O entender de um ser com medo
Faz e torna-se o próprio medo.

E aquilo que tanto nos aflige
ameaça, incinera
Começa a explodir o torpe
E o torpe mescla-se de importante

Vê sentido no que desespera
Vê razão no que não tem entendimento
Justifica sem ter por saber o que pensa ser correto/reto
E se perde em contradição.

Mas se para percebe que os passos
Não são tão fáceis
E o que vê não é paraíso...
mas sim o que se diz necessidade.

E aos poucos vai caminhando
Tomando senso, e contra senso
E o que deixa para traz são pausas
e o que passa a viver é vida.
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quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

Tecidos presos

Deitado no meio dos cortes
Pegue a agulha e costure a alma
Use do que sabe por fio
E de cada pedaço do que precisa por tecido

E se os retalhos podem ser juntados
Devem pois, ser ajustados
Se combinam faz-se um. Ou nenhum
Talvez se colora e se alegre.

Que os olhos se abram aos carretéis
E que o mundo se perceba diverso
E as linhas dançantes tenham movimento
Pois são da obra, a essência

Ligam-se os pedaços, materializa a união
Mas se desprende, se desmancha
E se desmancha, se perde. Talvez não.
Que leve o tempo incerto

Que comova cada estrutura
Onde os pedaços sejam emoção
E a emoção seja de sentir
Ainda que bem, ainda que mal.

Montada será sua veste, ou sua nova coberta de retalhos
Pequenos novos pedaços
Outros talvez um pouco mais gastos
Mas nem por isso insignificantes

A cada nova vivência,  novo sorriso
Cá estamos costurando,
E se cai alguma lágrima, essa se evapora
Pois não pode ser motivo para desengano

E no final, não haverá final
Pois a cada novo pedaço de pano
Esse aos outros se junta
Aumenta-se o o infindável

Torna-se cada vez mais bela
Mais útil, mais verdadeira
Reflete a obra o seu criador
E o seu criador ela o é.

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